quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Meus


Feliz tudo, amigos.

e ah, "sans toi, les émotions d'aujourd hui ne seraient que la peau morte des émotions d'autrefois". (Le fabuleux destin d'Amélie Poulain)
Estejam no meu 2010, por favor.

p.s:me desculpem a falta.

do meu lado, agora em mim

Esta imagem me confortou.
Ela ilustra a postagem “Feliz ano novo!!!” do sítio http://mombojo.wordpress.com/
.Mombojó. Som e sensações. Sinto muito.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Uma Bola de Natal


Esse blog nasceu depois do Natal. Mas a sua concepção se deu antes. Por isso, não custa reavivar o espirito natalino. Ainda que tardiamente.

O poema a seguir, de autoria de Fernando Pessoa sob o pseudonimo de Alberto Caeiro, foi interpretado no programa Provocações, de Antônio Abujamra. O poema propõe uma nova imagem de Jesus. Vale a pena ler. O link do site onde é disponibilizado a interpretação - memorável, não custa ressaltar - segue em baixo.

Narração do poema por Antônio Abujamra no seguinte link:

http://www2.tvcultura.com.br/provocacoes/poesia.asp?poesiaid=660



O Guardador de rebanhos
Fernando Pessoa

Num meio dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma fotografia
Vi Jesus Cristo descer à terra,
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu,
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu era tudo falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras,
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem

E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas -
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque não era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.

Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três,
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz

E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o sol
E desceu pelo primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz no braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras nos burros,
Rouba as frutas dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as cousas,
Aponta-me todas as cousas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus,
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar no chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia,
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.

Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -
"Se é que as criou, do que duvido" -
"Ele diz, por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
mas os seres não cantam nada,
se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres".
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.

Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural,
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.
E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre,
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E a outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é o de saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.
Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos a dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das cousas só dos homens
E ele sorri, porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos-mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade

Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do sol
A variar os montes e os vales,
E a fazer doer aos olhos os muros caiados.
Depois ele adormece e eu deito-o
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos,
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate as palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu no colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.

Esta é a história do meu Menino Jesus,
Por que razão que se perceba
Não há de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?


PS²: Imagem Isan 7inch cover

Cá choro


Vivo a fábula de cachorros que correm e falam. E choram quando comento das guerras, do comércio e da vida. Da falta dela. O modelo atual de vida já não comporta os seus adeptos. Ou são os adeptos que não se enquadram em padrões, apenas na busca deles.

O criador regido pela própria criatura. Homem e Mercado. Sua imagem e semelhança. Hierarquia, ganância, caos interior. Criatura de garras e leis. E vontade própria. O Mercado simplificou a vida em valores de troca. Valores quantitativos. Especulação. Mais valia. Segregação. Miséria legitimada. Sofrimento necessário. Igualdade na inconstância, em um horizonte turvo.

Difícil é viver uma vida de cachorro. Sofrer maus tratos dos humanos. Ser abandonado como algo sem valor. Que perdeu o seu valor quando adulto. Não é mais filhote, pode sobreviver sozinho. Então, passam a viver aventuras, explorar cenários novos, desafiar o ambiente tumultuado das cidades. Espirito desregrado e aventureiro. Dos cachorros. Os humanos preferem viver em jaulas de condomínios, em grades de presídios, em desejos aprisionados, em sentimentos subversivos reprimidos. São prisioneiros de grades de programação televisiva por medo de sair de casa. Uma passividade camuflada pelo conforto doméstico. Ser humano é ter medo. Ser cachorro é não ter medo de escondê-lo.

Para os cachorros, nada se iguala a uma boa vitrine, a um frango assado rodando suculento no espeto. Saliva desejo e degusta a imaginação. Como o sabor é bom. Cachorros não sonham com caviar. Caviar tem gosto de hierarquia e segregação. De títulos de nobreza. Um sabor amargo que os humanos apreciam.

Os cachorros não crucificaram um Poodle. Crucificariam um frango suculento, como dito a pouco, é certo. Porém, por genuína necessidade de alimentar-se. Os humanos crucificaram um homem, com lindas madeixas de Poodle, olhos azuis, pele branca. Ele não tinha pêlos de Buldog. Era cão de raça. Tosado e sacramentado. E, hoje, os Homens vislumbram a cruz em um sentimento de autopiedade. Com misericórdia da própria complacência com o ódio.

Semáforos, vias sinalizadas, imprudência. Morte cotidiana. Luxo, ostentação, miséria. Morte natural. Guerras, tiros, cadáveres. Morte em combate, morte legitimada. Sem mortes nunca haveria um vencedor. Um singelo sentimento de vitória basta. A dor alimenta a espécie humana.

Ah, se vivêssemos uma vida de cachorro.

PS: Imagem de Scotty Reifsnyder - Don Peris Holiday Concert poster

Ainda não nos gostamos


Recortes das minhas letras preferidas. A seleção virou uma espécie de carta. Sem destinatários.

Ainda me interesso por qualquer coisa que seja difícil de ser explicada e constrangedora de ser resumida. Mas no mais, você não me conhece mais. Quero dançar com outro par, e não é só pra variar, amor. Tá tudo bem. Eu tô levando tudo de mim que é pra não ter razão pra chorar. Procure dividir-se em alguém, mas não me procure em qualquer confusão. Porque eu quero ver você maior, meu bem. Pra que minha vida siga adiante, afinal. Sabe, saber mudar de tom, eu sei. Mas quero não saber de cor. De qualquer forma, adeus você! É difícil ser feliz mais do que somos todos nós? Esquece. Põe mais um na mesa de jantar, por favor. Hoje eu vou praí te ver, mas tire o som dessa TV, pra gente conversar. Sem ressentimentos. Toma este anel, que é pra anular o céu, o sol e o mar. Até a chuva do céu se encerrará pra ver nosso depois. Que pretensão poética. Pare. Não se atreva. Observe. Nem posso acreditar. Olha ali, quem tá pedindo aprovação. Tente nunca mais tentar viver o cara da TV, aquele, que vence a briga sem suar e ganha aplausos sem querer. Bem feito pra mim e bom pra você. Vai, deixa de lado o que se diz. Tem no mercado, é só pedir! Me faz chorar, e é feito pra rir. Tendo dito, tenho que ser sincera comigo, o amargo é querer-te pra mim. E isso não. Não assim. Eu sei que tanto te soltei que você me quis em todo o lugar. É o segredo, então? Abre a janela agora, e deixa que o sol te veja. É só lembrar que o amor é tão maior. Sim. Mas não. Eu vou ficar são. Mesmo se for só. Não vou ceder? Talvez. E no final? Eu sei que vou ser coroado rei de mim. Catarse. Nem de mim quero ser rei. Ainda bem que sobre estar só, eu sei. Você não é exclusivo. Em ti eu não consigo encontrar um caminho, um motivo, um lugar, pra eu poder repousar meu amor. E eu não quero ser salva. Quero o mar e o sertão! Sem ingratidão, vá lá uma concessão pelo o que foi. Pra nós todo o amor do mundo e pra eles o outro lado. Estive pensando, se eu fosse a primeira a voltar pra mudar o que eu fiz, quem então agora eu seria? Quantas assustadoras e reconfortantes possibilidades. E melhor, se eu for a primeira a prever e poder desistir do que for dar errado? Esquece de novo. Não sou covarde. Dispenso a previsão. Não tenho certeza, mas se o que eu sou é também o que eu escolhi ser, devo aceitar a condição. E você? Eu não perderia a glória de chorar. Absolutamente. Pode até ser que o esforço pra lembrar é minha vontade de esquecer. Pode. Pense bem, ou não pense assim! Sem retorno pra mim. Pra nós. Mas não faz disso esse drama essa dor, o único perigo é eu me esconder em você. Ninguém está imune à projeção. Eu me contento em andar, pois acredito que é reconhecer. Guarde um sonho bom pra mim, ta? Quem sabe o que é ter sem querer pra si é capaz de mudar o mundo. Mas não fala do que eu deveria ser pra ser alguém mais feliz. É compreensível que se eu peco é na vontade de ter um amor de verdade? O que justifica o quê? Sempre me questiono. E renego veementemente os especialistas que analisam e sentenciam sobre isso ou sobre qualquer coisa. Assim que o amor entrou no meio, o meio virou amor. Daí quem se atreve a me dizer do que é feito o samba? O meu bloco tem sem ter e eu vou nessa direção. Lamento. Vai chover de novo, deu na TV. E nem preciso dizer que o povo já se cansou de tanto o céu desabar. Fiquei mal com a constatação. Vem cá, que tá me dando uma vontade de chorar. Seja sincero, me diz, foi só amor ou medo de ficar sozinho outra vez? E você se preocupou com a repercussão? Pergunta retórica, evidentemente. Quem foi que te ensinou a rezar? Que santo vai brigar por você? Que povo aprova o que você fez? Apesar da cobrança, não tenho autopiedade, não. Pelo menos eu sinto. Me sinto bem, me sinto mal, mas sinto. Neste momento, e não no anterior e menos ainda no posterior, sinto como se a alegria recolhesse a mão pra não me alcançar. Conselho? Passo sem culpa, pois falar do que foi pra você, não vai me livrar de viver. Já experimentou ler, ver, escutar pra se perder no abismo que é pensar e sentir? Sabe, a foto mais bonita que eu fiz, era aquela de você olhando pra mim. Quanta verdade. Verdade? É difícil aprender do seu jeito. Mas sim, é no não que se descobre de verdade. Me conta. O que te sobra além das coisas casuais? Forte a revelação? Tenha dó, não mereces o afago nem de Deus nem do Diabo. Tá, não vou me exaltar. Desta vez, tudo será sem gritos. Só sussurros. Sem lamentações extras, todo o carnaval tem seu fim... Guardemos as fantasias para os próximos. Ou será que devemos renová-las? Já sei, a minha eu quero mais ousada e colorida. A sua poderia ser menos. Me desconsola perceber que toda escolha é feita por quem acorda já deitado. E como tudo se perpetua. Toda folha elege um alguém que mora logo ao lado. Eu posso, mas não devo pintar o estandarte de azul pra por suas estrelas no azul. Quero mudança. Se você se pergunta pra quê mudar, não sou mais a pessoa certa pra te esclarecer. Sem querer você passa então a amar, tudo aquilo que não ganhou. Tão previsível, pessoa. Não rezo a Deus no céu, nem a alguém no chão. As desculpas também não cabem aqui, eu tive que arranjar alguém pra passar os dias ruins. Para os bons não se precisa? Vou pensar. E não simplifique, traições são bem mais sutis.

P.S.: Agradeço aqueles que me emprestaram suas palavras, o que conheço de vocês é apaixonante. Sem pretensões, apenas abstraí a partir delas. E a belíssima ilustração chama-se Por qué cantamos? e é de autoria de Gustavo Aimar. Obrigada também.

Alegria - Cirque du Soleil


Assistam ao dvd da apresentação do Cirque du Soleil intitulada Alegria. Loquei-o casualmente, não supunha que era tão bom. Assisti pelo menos oito vezes ao dvd. Decorei a letra das músicas, anotei o nome de artistas, ensaiei a coreografia, imitei a encenação dos palhaços. Meu avô não suportava mais ouvir as músicas daquela peça, muito mais um teatro, um show, do que um circo convencional.

Alegria é diferente. Pensou-se no macro, o enredo fica em primeiro plano. Os artistas não são propriamente o destaque. Até os palhaços, tradicionalmente escrachados, possuem uma densidade psicológica. Flying Man é o meu número favorito.

Alegria mistura o lúdico e o real. Os personagens disputam o poder. O bobo da corte sente-se soberano. Por vezes pragueja durante as apresentações, como a do Russians Bars. As comadres bisbilhotam e invejam os outros habitantes. As ninfas vivem despropositadamente. Embarcamos em um reino de limites de sonhos sem limites. Não há convite. A platéia é tragada pelo ambiente envolvente do espetáculo.




Executado com expressiva maestria, o trapézio é o nosso primeiro contato com o ar. Trata-se de um romance que nos faz voar, seja pelas piruetas, seja pelo afeto envolvente das personagens. A música possui um teor dramático. Supus que alguém morreria nos moldes sheakespeareanos. Na minha mente, a trapezista cairia e sua cabeça partir-se-ia em quatro fatias de mamão, com as sementes quicando ensanguentadas em direção da platéia. Contudo a corda de segurança proporciona uma descida tranquila no final da apresentação, o momento oportuno para uma grande tragédia. A minha obsessão por dramas resvalou na rigidez do ensaio e na perfeição do espetáculo.

Power Track Act é o número mais entusiasmante. A performance das ninfas contagia pela perfeição das suas formas e gestos. A coreografia sincronizada empolga. A trilha sonora pulsa alegre na platéia vibrante. Singela a participação do Tamir adulto protegendo o público no final do corredor de elástico. Na outra ponta, um anjo do Russian Bars executa a mesma função. A comadre arranca gritos assustados das primeiras fileiras ao encenar uma queda. São detalhes bem pensados de um resultado encantador.

A apresentação do palhaço tempera a noite com doses pré estipuladas de nostalgia. A essência humana é dessecada. O domínio das expressões faciais é impactante. Arrepia. E faz chorar. A solidão é desvendada com muita propriedade por um palhaço, uma figura naturalmente solitária. A platéia assiste pasmada, atingida por respingos de abandono. Apenas os aplausos quebram com a frieza da tempestade de neve recém encenada. Somos aquecidos novamente pela realidade.

Flying Man desafia a nossa percepção de espaço. O figurino dá dinâmica aos movimentos do artista. A trilha sonora proporciona bem estar em tal medida que somos impelidos a soluçar lágrimas. O público sequer é capaz de bater palmas de tão impressionado que está. Flutuamos com o nosso desejo de voar. Por alguns minutos, voamos em sonhos. É fabuloso, simplesmente.

Impulsionado pelo entusiasmo que Alegria despertou em mim, loquei outras duas apresentações do circo, Varekai e Dralion, e redescobri o óbvio: Alegria é o melhor deles. Assistam.

Relato de uma boca delatora


Corromperam a minha praça. O Tráfico de drogas se enraizou nos jardins da praça da 21. Ela se transformou em um monstro de indefinidas cabeças e pouco mais que quatro bocas. Palmas perdeu o seu cartão postal. O consumo de ervas, agora, rola solto, e a solta. São quatro bocas fornecedoras e outras tantas bocas usuárias.


O cheiro doce da folha queimando causa náusea até aos estômagos mais resistentes. Quando visito o local, sinto fortes alucinações e posso até supor que também fumei o cachimbo da paz.

A fumaça excede o perímetro da praça. As nuvens de fumaça recobrem nebulosamente a paisagem. Os carros trafegam na rua de farol alto. Os casais que iam para o estacionamento da praça para copularem dentro do carro e economizar o dinheiro do motel já nem aparecem mais por lá. O cotidiano amoroso da praça foi prejudicado pela vida rastafári.

Além disso, o consumo de drogas alimenta os piolhos de Bob Marley. Lá se transformou no reduto do Reggae Jamaicano no Brasil, depois de São Luis. "Three Little Birds" é entoada por vozes descompassadas, inteiramente embebidas na paz, no amor e nas folhas de coca queimando.

O crucifixo azul da igreja ao lado irradia benção aos invasores da minha praça. O azul do crucifixo contrasta com os pequenos focos vermelhos das chamas. A tranquilidade da praça é consumida pelo ambiente tumultuado da fornalha.

O vento agita as folhas de pinheiro, e elas mexem, voam, tentam fugir da cena das suas irmãs sendo queimadas na forma de folhas de papel de celulose. Além disso, na alucinação do momento e na falta de maconha, qualquer folha verde serve para uma boa tragada. No fundo, as folhas de pinheiro sentem que também estão no cardápio.

PS: Texto escrito por uma boca delatora, a correspondente desse blog em Palmas - Tocantins.

PS²: Imagem de Milla Scramignon - Quente

ComMeta



Horas. Minutos. Segundos pensamentos restringidos pela primeira rotina. Primeiro a rotina. Ela preenche o nosso cotidiano. Os compromissos se sucedem. Uma infinidade deles, e apenas um deles permanece. Sempre permanecerá. O compromisso de repensar o mundo.
Todo tempo é tempo de pensar. Inove. Renove. Cometa. Um cometa que ilumine um céu negro de estrelas. Negro, mas com estrelas. Não aguarde o Sol nascer.

PS: imagem de TangYauHoong - Sail to the City

Retalhos de criatividade poética






Retalhos de papel.
Vento. Rajada de vento.
Pedaços de ideias espalhadas pelo ar.





São versos meus. Nada excepcional, nada de novo. Apenas o que consegui imaginar.


PS: Imagem de Kyle M Stone - Imagination Airlanes



terça-feira, 29 de dezembro de 2009

2009 Assistido


Meu ano foi particular. Muita coisa nova e importante que deveria ter aprendido na Escola, mas muitas vezes o excesso de informação me confundiu. Muita convivência com as pessoas que mais amo, o que torna todas as relações muito delicadas pela intimidade retomada. Pouca política e literatura, e quase o suficiente de cinema e sono.

Baseada na introdução, achei razoável refletir sobre 2009 a partir do que a sétima arte me ensinou. Quero mais Caros Amigos e Érico Veríssimo no futuro.

Não sei tudo sobre a minha mãe. E isso é mais do que saudável, é autopreservação. Apesar disso, retornar em uma jornada para explicar a si mesma o que não se pode explicar a quem mais amava foi um excelente pretexto para recuperar o que valia a pena e abandonar o que merecia ser abandonado.

Fale. Com ele, com ela. A diferença se notará em você. Adquira o hábito de ir à cinemateca ver filmes mudos e se dedique com paixão ao que e a quem ama. Assim, se é olhado com sensibilidade e complacência mesmo quando sob julgamento.

Pode ser neurótica e nervosa a convivência com o outro. Mesmo e, principalmente se este é inteligente e apaixonado. Não trocaria Nova Iorque pela Califórnia, não dirijo mal, não sou dependente da psicanálise, nem de baseado para o sexo e também não preciso de ninguém para me livrar de um aracnídeo. Tá, não sou a Annie. Mas também não sou simples e concordo que perder os letreiros em sueco que antecedem alguma obra-prima do cinema é frustrante. Nossas relações são muito complicadas. Por serem fluidas como a vida, é quase impossível achar o ponto do não retorno à felicidade acompanhada. Até pareceu que daria certo, mas até parece.

O cinema é inebriante. A vida é uma expedição ao Cairo, uma festa de gala na América. O importante é ser diferente da vida vivida. A lenda de uma rosa púrpura é fabulosamente atraente diante da depressão do país e dos maus tratos sofridos em casa. Mas quem ficaria com o personagem perfeito e desistiria do ator promissor? A realidade cheia de imperfeições se impõe, apesar disso sempre haverá o cinema. Expressão de alívio.

A miséria, sob qualquer manifestação, é de fazer chorar, pensar e chorar de novo. Durante um trajeto de carro ou pela vida toda. Quando mesmo começamos a agir? Quando o Pau Brasil for lenda? Repressão sexual, expressão sexual, violência sexual. Tudo misturado. Marido passivo que sonha em se travestir. Mulher infiel. Filho envergonhado. Homem repugnante. Filha e mulher alienadas. Filha revoltada e abusada. Filha adotada e sem pudor. Crianças mortas. Homem morto, mas podre em vida. Homem morto e preso. Filha freira, reprimida e alienada. Filha fugitiva e de futuro como o presente. Mulheres no mundo, o que pode ser quase fácil ou a única saída. Experiência intensa. Queria poder evitar o começo.

P.S.: A imagem é o que eu consigo desenhar no Paint sobre o tema. E de longe, meu pai gostou e até a nomeou. Estou feliz com a caricatura copiada.